Há exatos 20 anos, o Cleveland Browns recrutava pela primeira vez a primeira escolha geral depois de reabrir as portas em 1999. O escolhido na época foi Tim Couch, quarterback. No draft seguinte, a franquia também teve a primeiríssima escolha da classe e foi atrás de um pass rusher: Courtney Brown.
Por motivos distintos, Couch e Brown fracassaram.
Enquanto o QB até teve breve sucesso porém foi atrapalhado por lesões, o defensor totalizou 19 sacks na carreira até se aposentar e é visto como um dos grandes busts da história da NFL. Aquilo que era para ser o começo de uma era vitoriosa, com dois ícones, resumiu-se no pontapé inicial de uma série de campanhas pífias dos Browns.
De 1999 até 2018, Cleveland teve apenas duas temporadas com mais vitórias do que derrotas, sendo que nenhuma delas ultrapassou dez triunfos. Consequentemente, a equipe não conquistou nenhum título divisional e foi aos playoffs somente uma vez, em 2002, quando acabou eliminada na rodada de Wild Card. E de quebra, em 2017, CLE perdeu todos os 16 jogos que disputou.
Nesse período, além disso, 12 nomes diferentes foram head coaches do time. Pasmem, isso foi ainda pior entre quarterbacks: 31.
Isso mesmo, 31 QBs titulares diferentes estiveram under center pelos Browns desde 1999. O que configurou, de longe, a maior seca na posição de quarterback que a NFL já viu.
A situação dos Browns na posição de quarterback nos últimos anos resume, em geral, como foram os desempenhos do time ano após ano. Inconstante. Desorganizado. Vergonhoso. As coisas funcionam assim no futebol americano.
E é justamente por isso que a equipe de Cleveland respira novos ares agora.
Depois de décadas, os Browns encontraram seu quarterback. Claro, já vimos novatos impressionarem de imediato e depois falharem no decorrer da carreira. Mas este não parece ser o caso de Baker Mayfield. Se for, o que importa é que, pelo menos para 2019, os Browns têm uma referência dentro de campo.
Até então, por mais contratações e escolhas de primeira interessantes no draft que foram feitas, faltava um norte para Cleveland. Faltava saber para onde ir; mais precisamente quem seguir em busca de um objetivo.
Faltava.
A narrativa de tudo isso começou a mudar no Draft 2018, quando os Browns recrutaram Mayfield. O ex-Oklahoma também foi a primeira escolha geral daquela classe, a qual, aliás, foi uma das mais marcantes da história da NFL com cinco quarterbacks na primeira rodada.
Mayfield começou 2018 no banco de reservas e, em um mês, assumiu a titularidade do time. Mais que isso, mostrou ao torcedor dos Browns o que é ter real competitividade na NFL depois de muito tempo. Como calouro, em 13 partidas, o camisa #6 totalizou 27 touchdowns, quebrando o recorde que pertencia a Peyton Manning e Russell Wilson. O recorde dentro de campo mostrava, fora das quatro linhas, um sinal verde para a diretoria dos Browns. Um sinal do tipo “Eu estou aqui. Vamos nos preocupar em vencer agora.”
Vale ressaltar que a chegada de Mayfield foi posterior ao ano em que os Browns tiveram mais uma primeira escolha geral no recrutamento. Desta vez, o pass rusher veio primeiro: Myles Garrett, o qual era considerado um dos melhores prospectos dos últimos anos. Em duas temporadas, mesmo que com uma ou outra lesão, Garrett corresponde às expectativas.
As escolhas por Garrett e Mayfield representam várias coisas. Claro, representam as duas principais caras deste novo Browns. Representam o futuro da NFL, por que não?
Representam o que a NFL é hoje em dia. No ataque, o quarterback é a posição mais importante. Do outro lado da bola, o segredo é conseguir parar o QB adversário, e a tarefa mais “fácil” para isso é pressionando-o.
E tudo isso desencadeou e impulsionou a franquia de Cleveland para voltar aos seus melhores dias.
Ofensivamente, o fator Mayfield foi crucial para a persuasão de Odell Beckham Jr. na principal troca desta offseason até agora. OBJ se junta a Jarvis Landry e David Njoku, os quais foram adquiridos em 2017 com o intuito de serem sólidos alvos e facilitadores para quando — e depois disso, obviamente — um quarterback titular se firmasse em Cleveland. Bingo! E Mayfield estará em um backfield que conta com Nick Chubb, Duke Johnson e mais recentemente Kareem Hunt, o qual estará à disposição depois que cumprir os oito jogos de suspensão.
Este é o arsenal ofensivo que o novato head coach Freddie Kitchens terá à disposição. E a opção por Kitchens neste caso é mais uma que passa pelo fator Mayfield, afinal, o ideal para o jovem quarterback é um treinador que entenda de sistemas ofensivos.
Na defesa, a presença de Garrett fez a diretoria se preocupar em reforçar a secundária. A primeira consequência disso veio em Denzel Ward, quarta escolha geral no Draft 2018 que brilhou em seu primeiro ano na liga. Ward é o líder de uma secundária ainda limitada em alguns aspectos, mas que teve boas repostas na temporada passada.
A presença de Garrett também, para esta offseason especificamente, impulsionou a caça por alguém para atuar do lado oposto a Garrett na linha defensiva. Afinal, com a evolução das linhas ofensivas na atualidade, ter dois pass rushers eficientes é de suma importância. E isso explica a chega de Olivier Vernon.
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Assim como em 1999 e 2000, 2017 e 2018 trouxeram aos Browns duas primeiras escolhas gerais. Um quarterback e um defensive end. A diferença desta vez é o resultado dentro de campo.
O que foi visto de Mayfield e Garrett até agora, por mais que ainda recente, deu à equipe de Cleveland liberdade para iniciar um efeito dominó em torno de ambos. Reforce o que está ao redor deles, principalmente no caso do QB, e os resultados virão.
Isso aconteceu e é preciso lembrar que, após contratações badaladas, as expectativas aumentam. A cobrança aumenta. É preciso mostrar dentro de campo o investimento que foi feito fora dele. No caso do futebol americano, a pressão fica “dobrada” na posição mais importante do jogo.
De primeira escolha geral e ícone de um futuro promissor dos Browns, Mayfield é hoje o líder de um dos times mais badalados da NFL. Este é o preço pago por um vestiário com tantos nomes talentosos. Este é o preço pago por ser um bom jogador.
Mayfield talvez tenha que subir mais que um degrau de uma só vez. E o impressionante é que ele parece gostar disso. A competitividade do jovem quarterback faz toda a diferença neste caso.
Em 2019, a bola estará nas mãos de Baker Mayfield. Literalmente.
E figurativamente também.