Há dois anos, se alguém dissesse que Jalen Hurts seria quarterback de Oklahoma, sem a vaga de titular garantida, seria chamado de louco.
Hurts se tornou titular absoluto de Alabama em 2016, ano em que chegou à primeira das três finais nacionais com a universidade. Já na temporada 2017, com os Crimson Tide considerado o melhor time do futebol americano universitário, a principal pergunta da temporada chegou a ser, não quais times fariam a final do college, mas quem seria derrotado por Nick Saban e companhia.
Tal pensamento estava certo, considerando, claro, que não há coisa fácil no esporte.
Em dois anos como titular em Alabama, Hurts disputou 28 jogos, com 26 vitórias. Foram duas finais começadas, um título. Título esse que, contudo, não teve Hurts em campo no snap final para coroar o 17º título nacional da universidade.
No esporte também não existe lógica.
A segunda final disputada pelo titular Hurts, que terminou com o troféu, acabou sendo o último jogo começado pelo quarterback com a camisa de Alabama.
Naquela noite de 8 de janeiro de 2018, Saban viu possivelmente o pior primeiro tempo de um sistema ofensivo sob seu comando na história do futebol americano universitário. Irreconhecível, Alabama não tinha resposta para a energia de Georgia, e os 13-0 na ida dos times para os vestiários deixava isso claro.
A decepcionante atuação de Hurts na decisão, com 3/8 nos passes e 21 jardas apenas, também ilustrava a narrativa do confronto. Mais que isso, mudava os rumos do jogo, de Alabama e da carreira do próprio QB.
Saban decidiu sacar Hurts, dando a chance ao novato Tua Tagovailoa para os dois quartos derradeiros.
Ficou claro que lendário treinador, novamente, sabia o que estava fazendo: Tagovailoa (14/24, 166 jardas, 3 TDs, 1 INT) ajustou o sistema ofensivo e liderou uma das grandes viradas da história da NCAA, 28-24.
Profissional e ótimo colega de time, Hurts, que acabou por se tornar o primeiro QB negro campeão tendo começado um jogo por Alabama, celebrou como se ele tivesse sido “o cara” da final.
Todavia, o show do quarterback reserva significou o começo de uma era, e consequentemente o fim de outra.
Tagovailoa é um jogador parecido com Hurts no que diz respeito à mobilidade, liderança e entendimento de jogo. Contudo, o primeiro sobressai quando o assunto é habilidade e instinto na posição mais importante do futebol americano.
Portanto, Saban fez aquilo que qualquer treinador faria, e a titularidade dada a Tagovailoa, o melhor prospecto, de fato deixava a equipe mais competitiva.
Hurts continuou no elenco, foi acionado frequentemente em situações específicas ao longo da temporada passada, mas 2018 confirmou que Tagovailoa era realmente o QB nº 1. Apesar disso, Hurts conseguiu uma última oportunidade de brilhar com as cores de Alabama antes de decidir se transferir para Oklahoma em busca de uma última temporada universitária em alto nível.
Na final da SEC do ano passado, contra Georgia, o inverso daquilo que foi visto na final nacional de 2017 aconteceu: perdendo por sete pontos com pouco mais de 11 minutos restantes no último período, Tagovailoa se lesionou e deu espaço para Hurts buscar mais uma virada histórica para Alabama.
E os irônicos “deuses do futebol americano” não falham.
O camisa #2 totalizou dois touchdowns, basicamente não errou, e derrotou os Bulldogs, mantendo os Crimson Tide invictos e indiscutivelmente #1 no college football.
“É sem precedentes ter um jogador que ganhou a quantidade de jogos que ele (Jalen Hurts) ganhou,” disse Saban a conquista da SEC, protagonizada por Hurts. “Como um freshman, perder apenas dois jogos em todo o tempo como titular, e de repente ele não é mais o quarterback.
“Como você lida com isso? Como você suporta isso? Você tem que ter muita classe e caráter para colocar o time em primeiro lugar, sabendo que sua situação não é o que costumava ser.”
Aquele fora o confronto mais importante da universidade até uma nova decisão contra Clemson um mês depois, que não terminou com vitória de Alabama, mas teve Tagovailoa de volta under center.
Por que sair de Alabama?
É difícil dizer que a decisão de Hurts de deixar Alabama, onde ele fez história e ganhou enorme respeito pela atitude dentro e fora de campo como titular ou backup, foi errada.
Em 2018, ele totalizou 51 passes completos em 71 tentativas, 765 jardas, oito touchdowns e duas interceptações em 13 aparições. O momento solicita que Hurts resgate as estatísticas de um titular, algo já conquistado por ele no passado.
Nas temporadas 2016 e 2017, ele teve média de 197 acertos em 318 lançamentos feitos, com 2.430 jardas, 20 TDs e 5 INTs.
2019 será a última temporada de Hurts no college football, e as aspirações do Draft ainda são reais para ele. Ou seja, ao invés de participações pontuais como reserva de um dos principais quarterbacks da NCAA, o QB de 20 anos de idade tentará agora reassumir o status de titular, e uma nova chance de mostrar competitividade.
Não é que Hurts se incomodava em estar em segundo plano com os Crimson Tide embora tenha alcançado dois anos quase impecáveis. Se sim, nunca demonstrou. Porém, a narrativa da sua carreira exigiu que uma mudança como essa fosse feita.
Por que Oklahoma?
Geograficamente falando, Hurts nasceu em Houston, Texas. Desta maneira, ir para Oklahoma significa estar mais perto de casa. Além disso, os Sooners provavelmente são o time que melhor pode refinar o jogo do QB neste momento.
Baker Mayfield (2017) e Kyler Murray (2018), os dois últimos QBs titulares de Oklahoma, venceram o Troféu Heisman e foram recrutados como primeira escolha geral para a NFL.
Embora o talento puro de Hurts esteja abaixo de seus antecessores na posição, a forma como o head coach Lincoln Riley comanda seu sistema ofensivo é benéfica para quarterbacks. Não por acaso, Riley pode chegar à NFL em um futuro próximo.
Tanto Mayfield quanto Murray totalizaram mais de 40 TDs e menos de 10 INTs nos respectivos anos que foram treinados por Riley.
Por mais que o treinador já tenha dito que Hurts, o mais experiente e renomado QB de Oklahoma no momento, ainda precisa ganhar a titularidade na equipe, a tendência é que o agora camisa #1 seja o líder dos Sooners nesta temporada.
Tanner Mordecai, que está em seu primeiro ano com a faculdade academicamente mas já havia treinado com a equipe ano passado (redshirt freshman), não tem o entendimento de jogo, como Hurts. Tampouco a experiência.
E o mesmo pode ser dito para Spencer Rattler, o qual acabou de chegar ao time (true freshman) após ter sido avaliado por muitos como o melhor QB dual-threat da classe de 2019.
Lembrando que OU não tem mais Austin Kendall, já que o quarterback, com a chegada de Hurts, optou por se transferir para West Virginia, que não tem mais Will Grier.
Oklahoma venceu a Big 12 nas últimas quatro temporadas, e “bateu na trave” para a final nacional tanto em 2017 quanto 2018, os dois anos sob o comando de Riley. Ao buscar Hurts, a universidade tenta se manter competitiva liderada por alguém que já se mostrou capaz.
É uma relação de benefícios mútuos.
Uma nota tentativa — com prazo limitado
O cenário está montado para Hurts em 2019, e a história do atual QB dos Sooners é uma das mais interessantes da nova temporada do college football.
Não espere que ele seja selecionado em primeiro no próximo Draft, como foram Mayfield e Murray. Nem mesmo na primeira rodada isso deve acontecer. A precisão de Mayfield em todos os níveis do campo são quase inigualáveis, e a combinação de habilidade atlética, precisão e improviso de Murray parecem casar perfeitamente com a NFL atualmente.
Sem dúvidas, entretanto, o ataque orquestrado por Riley pode elevar o nível de Hurts e o colocar em alta em uma classe de QBs de 2020 que promete ser especial.
Para o Troféu Heisman, porém, as casas de apostas colocam Hurts como o terceiro melhor nome, atrás de Trevor Lawrence e Tagovailoa.
Enquanto as odds ilustram em geral o que pode estar guardado para Hurts, no fim das contas, elas ficam em segundo plano. E não poderia ser diferente: Hurts tentará retomar uma carreira que, ironicamente, hoje não é impecável. Ele tem uma temporada para isso, e qualquer coisa a mais é lucro para o quarterback.